Escrevi este texto para representá-lo numa residência artística que fiz ano passado.
Resultado : a personagem saiu-me uma porcaria, mas o texto cá continua, e agora achei que era o momento certo de o partilhar.
Um dia gostava de ver uma personagem num monólogo a dizer isto como deve ser e não uma pseudo-personagem como a minha foi.
Lisboa consome-me.
A cidade consome-me como os habitantes desta cidade me consomem. São todos iguais, os lisboetas. Todos gostam da cidade e pior que isso, orgulham-se dela.
Eu também sou igual a todos os lisboetas. Quero Lisboa para mim, mesmo que ela me consuma. Lisboa criou em mim um sentimento egoísta. De querer viver aqui infinitamente, mas de viver nela sozinha. Não sei se sabem, mas Lisboa ensinou-me que a cidade é para se viver acompanhado. Até agora vivi sempre sozinha.
Já me apaixonei nesta cidade. Epá, pois já. Já senti aquelas borboletas no estomâgo. Borboletas daquelas que não sobrevivem em Lisboa. Costumam vê-las a voar por aqui? Apaixonei-me nesta cidade, sentir aquele desalinho, dentro e fora do corpo, como que depois de uma sexta feira à noite de copos no Bairro Alto. É bom, mas falsamente na ressaca, juramos que nunca mais.
Esta cidade consome-me porque é demasiado pequena. As ruas são demasiadas estreitas, onde nos permitimos a demasiados encontrões, a dar os mesmos bons dias aos sábados de manhã no café de sempre e a dar as mesmas boas noites na discoteca de sempre. Sabem o que gosto de fazer nos meus tempos livres em Lisboa? Jogar às escondidas. Sabem porquê? Nunca ninguém ganha! A puta desta cidade ganha sempre.
Uma vez conheci um lisboeta que quis comigo fazer o roteiro da cidade. Predispôs-se a conhecer comigo todos os becos desta cidade, porque dizia ele, “há tantos becos em Lisboa e ninguém os aproveita. São os únicos sítios desta cidade onde podemos estar sossegados. Convenceu-me a fazer esse roteiro. Não posso dizer que tenha corrido mal. Até os becos desta cidade são bons para visitar. Depois dos becos ele quis mostrar-me as melhores bairros desta cidade. Acho que ele quis mostrar-me coisas demais e eu optei por voltar a passear sozinha na cidade.
Quis descer com ele a Sé a uma quinta-feira, mas numa sexta-feira já queria estar sozinha na Brasileira a beber café. Podia tomar o pequeno almoço com ele em Belém, mas queria estar sozinha à noite num miradouro da Graça.
Lisboa consome-me por isto. Fez-me egoísta. Até ter todo o mapa da cidade na cabeça, a cidade só serve para mim, sozinha.
1 comentário:
finalmente tiveste coragem de o partilhar! go girl ;)
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