Há muitas vantagens em ser-se solteiro. Essa condição é ainda mais confortável quando sabemos aproveitá-la.
No entanto, sei o que me mais me faz falta. Numa das fases mais tristes da minha vida, quase que deixei de ir ao cinema, de ler livros, de ver filmes em casa, de ir ao teatro, de ouvir música nova... e não entendia porquê, quando é aquilo que mais me dava (dá) prazer.
Agora entendo : deixei de ter com quem partilhar a estupidez intelectual que cultivo.
Partilha-se com os amigos e com os interessados, é certo, mas a Kit-Kat por vezes gosta de ser intelectualmente fundamentalista e de estar a discutir até ao ínfimo pormenor um detalhe de um filme que lhe fez lembrar outro filme, ou uma passagem de um livro que a incomodou.
E eu deixei de ter com quem partilhar isso -com quem se interesse da mesma forma que eu e que tenha paciência para me ouvir e discordar comigo até que nos cansemos. Eu não posso mandar uma mensagem às 3h da tarde a alguém a dizer que me estou a sentir como a personagem do Milan Kundera. Ou ficar meia hora a dissertar sobre o fantástico actor que acabei de ver no palco.
Os meus amigos aturam-me, mas não tanto.
Lentamente, recupero os hábitos, mas sim, sinto sempre um vazio cada vez que acabo de ler um livro ou de ver um filme. Sentir a falta "daquela" companhia. Daquele "cavaleiro andante" que morasse no meu livro de aventuras.
Vou sentir de novo isto quando terminar o livro do Pepetela que estou a ler e quando terminar de ver o filme " De tanto bater o meu coração bateu".
E senti tudo isto ainda mais profundamente enquanto ensaiava e enquanto estava em palco.